Jogadores da seleção da Geórgia comemoraram a classificação para a Euro com a população (Foto: Getty Images) |
A Eurocopa deste ano tem como única seleção estreante a Geórgia. A equipe de Kvaratskhelia e companhia representa o país de 3,7 milhões de habitantes que fica entre a Europa e a Ásia, cercado por montanhas e às margens do Mar Negro. A classificação para a Euro-2024 é fruto de longo processo de desenvolvimento do futebol local.
A Geórgia estreia na Eurocopa no dia 18 de junho, contra a Turquia, às 13h.
A tão sonhada vaga na Eurocopa foi conquistada na vitória nos pênaltis sobre a Grécia, após empate sem gols no jogo único pelos playoffs da repescagem das eliminatórias. A Geórgia vai encarar na fase de grupos a Turquia, República Tcheca e Portugal.
— Um dos meus filhos é, acredito, o maior fã do Cristiano Ronaldo na Terra. Será um grupo muito difícil, com Portugal como potência. Turquia tem trabalhado muito bem nos últimos anos, com jovens talentosos. A República Tcheca teve ótimos atletas ao longo da história. Finalmente, a Geórgia: um pouco curinga, entrando despercebida. Daremos tudo o que temos — afirmou o técnico Willy Sagnol, à Uefa.
E esse lugar nos playoffs foi fruto de boas campanhas na Liga das Nações. A Geórgia já conseguiu dois ascensos, tem um dos maiores percentuais de vitórias no torneio (61% do total) e vai disputar a segunda divisão da Nations League em 2024/25.
A Euro-2024 será a primeiro grande competição da história da seleção da Geórgia. A equipe quase se classificou para a edição anterior, mas perdeu para a Macedônia do Norte por 1 a 0 no último jogo. O Estádio Boris Paichadze estava vazio por causa das restrições da pandemia de Covi-19. Realidade bem diferente da vitória sobre os gregos, com mais de 55 mil torcedores na casa do Dinamo Tbilisi.
— A final foi provavelmente o cenário mais estressante que vivi em minha vida. Quase 60 mil pessoas no campo, tantas outras do lado de fora do estádio, na cidade e em toda a Geórgia vendo o jogo juntas. Vencer nos pênaltis, de forma tão dramática. A nação entrou em erupção de alegria — contou Luka Lagvilava, criador do perfil “Georgian Footy” no X (ex-Twitter), que traz notícias sobre o futebol georgiano.
Lagvilava considera que o sucesso tardio da seleção georgiana tem a ver com a falta de estrutura no período pré-independência da União Soviética, que se consumou em 1991. O primeiro jogo oficial em competição da equipe masculina adulta foi em setembro de 1994.
— A principal razão para a Georgia só se classificar agora pode ser vista como falta de desenvolvimento antes. Não havia condições para treinar e jogar, falta de luz e aquecimento, equipamentos ruins, treinos de baixa qualidade e outras dificuldades. Isso valia para qualquer organização na Geórgia, o que dizer sobre o esporte — comentou.
Ele e outras fontes consultadas pelo ge consideram que uma das razões, se não a principal, para esse desenvolvimento foi a reestruturação das categorias de base do já mencionado Dinamo Tbilisi, clube da capital, a partir de 2012. O Dinamo revelou jogadores como o atacante Kvaratskhelia, hoje no Napoli, e o goleiro Mamardashvili, do Valencia.
Pessoa fundamental nesse processo foi o treinador Andres Carrasco. Ele dirigiu as categorias de base do clube em duas ocasiões: entre junho de 2011 e julho de 2012, e depois entre janeiro de 2022 e agosto de 2023.
Uma de suas atribuições foi elaborar um plano para encontrar talentos pela Geórgia, além de formar treinadores. O espanhol tem no currículo passagens por Barcelona e Shakhtar Donetsk.
— Desenhei todos os programas de desenvolvimento na base, coletivos e individuais. A filosofia de trabalho do Dinamo se baseia na alta qualidade de jogo, no futebol ofensivo e na cultura de trabalho coletivo. Fornecemos às seleções muitos nome, mais de 90 se contarmos equipes inferiores. O Dinamo é o único clube focado no crescimento dos atletas — disse Andres Carrasco, hoje técnico principal do Dinamo Tbilisi.
A classificação é um sucesso para toda a família do futebol georgiano. O país tem em sua história muitos jogadores de qualidade, que jogaram em grandes ligas, mas que nunca tinham alcançado a Eurocopa. O sucesso atual é fruto de todas as ações de todos os técnicos que trabalharam no Dinamo Tbilisi."
— Andres Carrasco, treinador do Dinamo Tbilisi.
O futebol da Geórgia é historicamente famoso por produzir pontas técnicos e rápidos. Porém, nos últimos anos, o campeonato local e a seleção têm visto uma diminuição disso. Há críticas sobre o modelo de jogo adotado pela equipe, com cinco defensores na última linha.
Mas foi esse sistema que garantiu o país pela primeira vez na Eurocopa. Solidez na fase defensiva e explosão nos contra-ataques com Kvaratskhelia, Chakvetadze e Davitashvili. A atual geração é considerada a melhor nos últimos 10, 15 anos.
O sucesso da seleção e de seus principais nomes no futebol europeu tem levado mais observadores técnicos de clubes estrangeiros a procurarem novos talentos na Geórgia. O mercado é considerado barato.
E o atleta formado no Dinamo Tbilisi mostra, geralmente, maior capacidade para lidar com situações de jogo adversas, além de habilidade com a bola e inteligência individual.
— Há uma relação significativa entre as categorias de base do Dinamo Tbilisi e o desenvolvimento do futebol da Geórgia. A maioria dos atletas das equipes nacionais e principal ou de base passaram por lá. É o clube líder em fornecimento de talento para as seleções — comentou Mikha Gabechava, hoje observador técnico do Gent, da Bélgica. Ele trabalhou como scout para o Dinamo Tbilisi por um ano.
A Geórgia teve também trabalho de aumentar a popularidade do futebol do país, visando mais pé de obra para a seleção principal. Entre 2015 e 2021, o número de homens registrados na federação saltou de 14,676 para 37,600. O de mulheres cresceu mais de 10 vezes.
A federação georgiana de futebol (GFF) conseguiu dinheiro junto à Uefa para a renovação de infraestrutura, como estádios e centros de treinamento. Mais clubes com melhores condições têm elevado a competitividade na base contra o Dinamo Tbilisi.
Só por participar desta Eurocopa, a GFF vai receber 9,25 milhões de euros, o equivalente a R$ 51,9 milhões.
Por Jorge Natan e Rodrigo Lois
ge Dortmund, Alemanha
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