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terça-feira, 22 de agosto de 2023

Sacerdote, prefeito e dono de time: conheça o padre que une religião, política e futebol no interior de SP

Foto: Emilio Botta
É provável que você já tenha ouvido alguma vez o ditado popular que diz "política, religião e futebol não se discutem". Em Catanduva, a cerca de 400 quilômetros da capital São Paulo, um padre não só discute os polêmicos assuntos, mas também é prefeito e dono de um dos times da cidade.
O ge esteve no munícipio do interior paulista para acompanhar a rotina do padre-prefeito-cartola que tenta tirar o Catanduva Futebol Clube, clube que ele mesmo criou e hoje é dono de 90% da SAF, da quarta e última divisão do estadual.
Função padre
O relógio marcava menos de oito minutos para as 6h. Caminhando enquanto falava ao celular, padre Osvaldo discutia a agenda do dia enquanto se preparava para rezar a missa na capela Padre Albino, anexa ao hospital que leva o mesmo nome. Cerca de 20 fiéis o esperavam para a celebração antes do amanhecer (veja no vídeo acima a rotina dele como padre).
Padre há quase 25 anos, Osvaldo de Oliveira Rosa passou por missão na África antes de fixar residência em Catanduva, onde vive há mais de duas décadas. A missa rezada todos os dias às 6h - e transmitida em sua rede social - é uma forma de manter as raízes como sacerdote antes das atribuições como prefeito e dono de um time de futebol ao longo do dia.
A roupa social que vestia na chegada à igreja foi trocada pela batina branca. Durante a missa de pouco mais de 40 minutos, padre Osvaldo falou sobre a insatisfação constante do ser humano e o quanto reclamar se torna um veneno para a vida.
Os olhares atentos das pessoas presentes são uma amostra do quanto o padre é quase unanimidade como religioso na cidade. A reportagem do ge conversou com diversas pessoas sobre a multifuncionalidade dele. A maioria delas prefere separar a imagem do religioso da de político.
Até o fato de ser dono de um time de futebol não faz diferença para quem o acompanha – muitos sequer sabiam que ele é cartola.
O nosso foco é a missão, servir as pessoas que fazem parte da política, que estão nas igrejas e vivem a fé e a religião, e também servir através do esporte. Quando a meta é única, o maior patrimônio da humanidade é a pessoa humana e essa pessoa está na política, na religião e também no esporte — afirmou o padre.
Da igreja para a prefeitura
Padre Osvaldo termina a missa, retira rapidamente a veste sagrada e entra no carro em direção à prefeitura. Antes disso, faz uma parada para rezar e liberar os funcionários de um mutirão de limpeza na cidade. Mais de 79 toneladas de lixo haviam sido retiradas das ruas nos últimos dias.
Ele não consegue caminhar mais do que 100 metros pelas ruas da cidade até ser abordado por alguém que pede oração, ajuda, alguma melhoria onde mora ou simplesmente para comentar o desempenho do time.
Na chegada ao gabinete, uma mostra do quanto a religião, o futebol e a política fazem parte da rotina. Palmeirense fanático, uma camisa autografada chama atenção ao lado de um quadro com o escudo do Catanduva. Do outro lado da sala, uma imagem de Nossa Senhora Aparecida em meio aos vários quadros de menções políticas.
Padre Osvaldo (PL) foi eleito prefeito de Catanduva com 38,01% (20.981) dos votos válidos em eleição realizada em 2020. O mandato dele vai até o fim de 2024. Na época, o religioso declarou ao Superior Tribunal Eleitoral (TSE) patrimônio de R$ 4.601,76.
A semelhança das funções é o foco em servir a pessoa humana em cada segmento e estágio. A diferença é que na vida religiosa as pessoas buscam com o sentimento de servir, participar e com o objetivo de se encontrar. Na vida pública as pessoas buscam visando os seus interesses, 99% da nossa convivência por trás tem o interesse e a necessidade.
Na área esportiva é a paixão e a razão. A ideia é gerar para o povo a paixão de vibrar, torcer e comemorar ao mesmo tempo com a razão por estar lidando com sonhos e expectativa de jovens adolescentes, sendo rígido para proporcionar não só uma vida digna e monetária, mas também de poder criar uma família e ser um cidadão – analisou o padre.
A popularidade do padre Osvaldo diminui quando o assunto é a forma como ele administra a cidade. A reportagem do ge esteve no centro de Catanduva durante a festa de “São Domingos”, padroeiro local, conversando com alguns moradores da cidade.
A principal reclamação é sobre a prioridade dos investimentos — muitos acham que o prefeito tem pintado e “maquiado a cidade”, além de colocar inúmeras lombadas nas ruas. E que algumas das promessas feitas durante a campanha ainda não foram cumpridas.
Ele gosta de uma lombada, viu? E tem sinalizado ruas que na verdade precisam de asfalto. Gosto dele como fiel, mas não irei votar nele novamente. É melhor padre do que prefeito, misturou e não deu certo – disse uma moradora, que não quis ter o seu nome identificado na reportagem.
Outras pessoas consideram que a cidade estava abandonada até a gestão atual. A trajetória no comando de vários projetos sociais feitos ao longo de mais de duas décadas parece ter impulsionado a popularidade do atual prefeito.
Sempre apoiei o padre Osvaldo, acompanho desde pequeno na igreja. Ele sempre foi uma pessoa muito humana que preza ajudar as pessoas e a cidade. Isso está sendo muito bom para Catanduva. Sinceramente não sei como ele faz (ser padre, prefeito e dono do time de futebol) – disse o promotor de vendas Mateus Soares da Silva.
Padre Osvaldo tem consciência das funções que ocupa, mas evita o rótulo de “político”. Ele não garante que irá concorrer à reeleição em 2024, apesar do desejo de dar continuidade ao trabalho que vem realizando na cidade. Para conseguir novamente ter os votos necessários para seguir à frente da prefeitura, usa a experiência de lidar com torcedores, eleitores e fiéis.
O torcedor, se o time estiver bem, ele é ótimo. Mas, se estiver passando por alguma dificuldade, sem os resultados, ele é xarope. É duro, torcedor é duro. Numa mesma partida ele elogia e critica, acha que tem que mudar. O torcedor é momentâneo.
O eleitor, o munícipe, ele é de necessidades, sempre busca satisfazer isso. O fiel sempre busca trabalhar o interior, é mais uma vivência interior de melhorar os problemas interiores. São essas as diferenças – disse o padre.
Dono de time de futebol
O Catanduva Futebol Clube foi fundado pelo padre Osvaldo no dia 16 de novembro de 2017. O clube surgiu na tentativa do padre de atrair crianças da comunidade para as aulas de catequese. Para que isso desse certo, ele criou uma escolinha de futebol que só receberia as crianças que tivessem frequentado as aulas de estudo religioso durante a semana.
A atual temporada é apenas a quinta do clube no futebol profissional. O time avançou à quartas de final depois de ser líder de seu grupo na terceira fase, com três vitórias e três empates, deixando para trás equipes tradicionais, como Rio Branco, Penapolense e Jabaquara. Agora, enfrenta a Francana — apenas os dois finalistas sobem para a A3.
Sacerdote, prefeito e dono de time: como padre une religião, política e futebol em cidade
O Catanduva ainda não possui 100 jogos em sua história. Até o momento, foram 87, com 31 vitórias, 34 empates e 22 derrotas desde 2018, com aproveitamento de 48%.
O escudo do Catanduva tem as cores da bandeira da cidade, com uma engrenagem representando as empresas e uma cruz ilustrando a ligação com a Igreja Católica. O mascote do clube é São Domingos, santo padroeiro da cidade.
O atual técnico do Catanduva, Ivan Canela, é um exemplo do uso do clube para ajudar as pessoas da comunidade. Ele havia desistido da carreira após contrair Covid-19 quando comandava o Rio Preto, time da cidade vizinha, e transmitir o vírus para a mãe e o pai, que acabou morrendo.
O convite para ser gerente de futebol foi uma forma do padre Osvaldo ajudar Ivan no pior momento da sua vida. Agora, ele acumula as funções após ser efetivado como treinador.
Foi uma situação bem complicada no período da pandemia. Nessas idas e vindas para casa eu estava com Covid. Acabei levando para dentro de casa, meu pai e minha mãe ficaram intubados, e o meu pai veio a falecer.
Fiquei 34 dias com a minha mãe no hospital, tinha até parado e ficado desgostoso com o futebol. O padre me fez um convite para trabalhar com ele, me surpreendeu e e evoluí como pessoa. Vou levar esse momento para o resto da minha vida – disse Ivan Canela.
Mas, afinal, de onde vem a grana?
Padre Osvaldo garante que o Catanduva é mantido através de duas fontes de receita: dinheiro do próprio bolso e de apoiadores locais que gostam de futebol. O padre garante que não há dinheiro público envolvido.
O que chama a atenção é que dois dos três patrocinadores da camisa do Catanduva são empresas de propriedade do padre Osvaldo. A “Bom Pastor Marketing Esportivo”, criada em 2018 e com capital social de R$ 450 mil, além do banco digital “BPME”, que ainda não saiu do papel efetivamente e é um dos projetos do padre para aumentar a receita do "Santo", apelido do clube.
Na temporada passada, o Catanduva ainda investiu na criação de uma “bet”, mas o site de apostas acabou sendo deixado de lado por problemas de operação.
A prefeitura municipal não injeta um centavo no Catanduva Futebol Clube. Os recursos nós buscamos de parceiros, torcedores e especialmente de empresários que desejam colaborar com o Catanduva. Muitos deles não querem aparecer e estão por trás nos ajudando com recursos para manter essa estrutura.
– Sempre procuramos buscar recursos para manter o clube, seja do próprio bolso ou de pessoas que contribuem. Nós vamos atrás de 100% desses recursos – garantiu o padre, dono de 90% da SAF do Catanduva. O restante do percentual é dividido entre dez pessoas da comunidade.
Segundo o padre, o maior salário de um jogador no Catanduva é de cerca de R$ 5 mil, sem contar bichos e premiações. Apesar disso, estima-se que o clube tenha uma das maiores folhas salarias da Segundona do Campeonato Paulista, competição que reúne jogadores de até 23 anos.
O Catanduva tem apostado no pagamento de salários em dia, contratos longos e promessa de boas premiações em caso de metas cumpridas, para atrair jogadores com propostas melhores de outros clubes. Tudo isso é pensado por Ivan Canela.
Acredito que não devemos ter a maior folha ou uma das maiores. O Catanduva é exemplo de administração, paga em dia, cumpre com seus compromissos e tem uma premiação que deixa os atletas felizes. Perdi 17 jogadores para outros clubes por questão de valores, teve um time que levou sete jogadores que eu gostaria de ter. Em termos de folha que vemos por aí, o Catanduva não está nem entre os dez. Atraímos os jogadores pelo nosso projeto de humanizar – disse Canela.
Padre negocia o “bicho” com os jogadores
Padre Osvaldo é quem administra os recursos financeiros do Catanduva. Qualquer contratação precisa ser aprovada pelo dono do clube. E ele vai além disso: negocia diretamente com os jogadores o valor da premiação por jogos, conhecida também como "bicho".
E quando um time decide um título ou um acesso de divisão, como é o caso do Catanduva neste momento na última divisão do Campeonato Paulista, a negociação exige jogo de cintura e uma abordagem incomum para um padre e um prefeito.
No bate-papo com os jogadores em que o ge esteve presente, padre Osvaldo revelou os valores que combinou com o elenco em caso de vitórias nas últimas três rodadas da terceira fase.
Do total de R$ 2.100 prometidos para cada um, os jogadores conseguiram garantir R$ 1.600 com as vitórias sobre Rio Branco e Penapolense. Na última rodada, o empate contra o Jabaquara, fora de casa, impediu um prêmio ainda maior.
A vitória aqui seiscentão (contra o Rio Branco), contra o Penapolense será R$ 700 e lá contra o Jabaquara R$ 800. Dá para vocês tomarem um sorvete, suco de laranja e o que mais? Água, então dá para tomar um sorvete de morango – brincou o padre, que causou risos entre os jogadores após sugerir como gastar o dinheiro da possível premiação.
Padre Osvaldo ainda revelou ao ge que precisou demitir um jogador envolvido em esquema de manipulação de resultados e apostas esportivas que havia sido contratado pelo clube. O problema, aliás, é frequente na quarta e última divisão do Campeonato Paulista.
Rival sem apoio tenta se reerguer
Atualmente, o time mais antigo da cidade, o Grêmio Catanduvense, rival do Catanduva, está há quatro temporadas sem disputar uma partida profissional. Fundando em 2004, o "Bruxo", como é apelidado, teve ascensão meteórica ao chegar na elite do Campeonato Paulista em 2011.
A única participação na primeira divisão estadual foi o início de uma queda impressionante do clube, que em 2017 acabou retornando para o último nível do Campeonato Paulista.
A meta é voltar a disputar uma competição profissional nos próximos anos. Neste ano, o Grêmio Catanduvense acabou deixando o Paulista Sub-20 em virtude ao atraso no pagamento de parcelas de uma dúvida com a Federação Paulista de Futebol (FPF).
Sem apoio da prefeitura de Catanduva, o Grêmio Catanduvense atualmente está inativo após a eliminação no estadual sub-20. A meta é tentar participar da Copinha no próximo ano e conseguir retomar o time profissional, que disputaria a quinta e última divisão estadual.
O clube vive de recursos próprios da receita da SG Sports, minha agência particular. O Grêmio Catanduvense não tem nenhum apoio, nem da cidade nem da prefeitura. Somente a Secretaria de Esportes que nos ajuda com a liberação dos espaços físicos para os treinamentos e o estádio Silvio Salles nos dias dos jogos.
Temos um projeto de longo prazo e estamos buscando recursos para tocarmos o clube. Já estamos visando a disputa da Copinha e as demais competições do profissional – disse Sérgio Gomes, ex-jogador de futebol e atual presidente do Grêmio Catanduvense.
O time mais antigo e vitorioso da cidade deixou marcas. O estádio Silvio Salles foi recentemente reformado pela prefeitura de Catanduva com as cores azul e branco do Grêmio Catanduvense. Até uma placa de sinalização dentro do estádio faz menção ao vestiário do clube e não do rival Catanduva.
Sempre procuramos oferecer apoio, estive na Federação Paulista em 2021 levando dirigentes do clube até lá. Por outro lado, é uma tristeza imensa saber que a história do futebol profissional de Catanduva foi colocada e ferida nas mãos de pessoas com certos interesses que de alguma forma acabaram com um clube da nossa cidade. Para o Grêmio Catanduvense voltar será muito difícil devido a pendência financeiras e trabalhistas de outras gestões – disse o padre prefeito Osvaldo.

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